6 de abr. de 2009

Primeira vez

na primeira vez em que te vi
foi como ver a mim mesma dez anos atrás

não te achei bonito
mas imaginei a tua mão de unhas grandes
de violão
na minha cintura

e imaginei como seria deitar sobre
teu corpo
e depois sob
e depois beijar tua boca
com meu gosto nela

e não imaginei mais nada
porque não era dez anos atrás

Alice disse

"não fique confuso
muso de alguma obra-prima
pode ser tudo amor
à rima"

(Alice Ruiz)

Declaração de amor

"- (...) só vejo você por toda a parte e o resto me é indiferente. Por que e como a amo, eu o ignoro. Sabe, talvez você não seja nada bela. Imagine! Não sei nem mesmo se é bela ou não, mesmo seu rosto. Seu coração é seguramente mau e seu espírito muito provavelmente despido de nobreza. (...)

- (...) No meu quartinho, lá em cima, basta que me lembre ou imagine o roçar de suas roupas para ficar a ponto de morder os dedos. (...) Sabe que um dia vou matá-la? Não por ciúmes, nem por ter deixado de amá-la. Não. Vou matá-la simplesmente porque há dias em que tenho vontade de devorá-la. (...)

(...) Deus é testemunha de que não sei se ela é bonita, mas adoro olhá-la quando se planta assim a minha frente - e só porque adoro provocar sua cólera. (...)

- (...) Sou tomado com freqüência por um desejo irresistível de lhe bater, de desfigurá-la, de estrangulá-la. Acredita que não chegarei a tanto? Você me enfurece. Julga que eu temeria o escândalo? Ou sua fúria? Eu me lixo para a sua fúria! Eu a amo sem esperança e sei que depois disso a amarei mil vezes mais. Se eu a matar um dia, será preciso que me mate também. Bom, eu me mataria o mais tarde possível, para experimentar, sem você, este sofrimento intolerável! Saiba de uma coisa incrível: a cada dia eu a amo mais e, no entanto, é quase impossível. (...)

- (...) Sei que quando está comigo, sinto vontade de falar, de falar, de falar... e falo. Perco todo amor-próprio em sua presença e não ligo para isso! (...)

(...)

A culpa é de Paulina, tudo é culpa dela! Talvez eu nem mesmo soubesse cometer gaiatices caso ela não estivesse lá. Quem sabe eu tenha feito tudo aquilo por desespero (ainda que seja estúpido raciocinar assim), e eu não compreendo, não, o que ela tem de bom. Ela é bela, ao menos me parece. E não sou o único que ela põe louco. Ela é alta, bem feita. Mas é demasiado esbelta. Tenho a impressão de que seria possível dar-lhe um nó ou dobrá-la em dois. (...) O desenho de seu pé é longo e delgado... torturante. Torturante, eis a palavra."

(Dostoievski, "O jogador")

4 de abr. de 2009

Temperatura

Debruçada no colchão
motivo algum para se sentir mal
(e não se sente)
o contrário: para contentamento

Não está misantropa como de costume
até acha graça no sujeito nu a seu lado
dormindo depois do dever cumprido

Não está preocupada com a conta de luz
prefere a escuridão
tanto melhor se cortarem

Nem curiosa pelo passado
nem saudosa pelo futuro
a cabeça encaixada no presente

Mas está morna como a água do chuveiro elétrico
que queima se ligado com a máquina de lavar